Não havia sinos em Ravenshire. Não há muitos anos. Mas naquela noite, o som ecoou claro, cortando a neblina com a precisão de um presságio. Três notas. Longas. Lentas. E impossíveis.
Ezra largou o livro que lia e ficou de pé em um único movimento. O tempo ao seu redor pareceu hesitar — como se a própria noite quisesse ouvir melhor.
Não era um engano. Ele conhecia aquele som.
Era o mesmo que ouvira no exato momento em que a história desmoronara pela primeira vez. Era o chamado.
Ele desceu os degraus de sua casa antiga sem pegar o sobretudo. O frio não o incomodava mais. O que o movia agora era outra coisa. Um sussurro enterrado em sua memória. Um nome que ele ainda não ousava pronunciar.
Quando chegou à clareira no limite da floresta, a neblina se abriu como cortinas de teatro. E ali, entre as árvores, havia algo. Um livro. Abandonado no chão.
E uma única flor — fresca, viva, sobre a capa fechada.
Ezra se ajoelhou. Seus dedos tocaram a flor com reverência. A mesma espécie que ela usava no cabelo. Há vidas atrás. — Então é verdade… — murmurou, com um peso antigo na voz. — O ciclo está recomeçando.
E atrás dele, sem que notasse, a sombra de alguém observava em silêncio.
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